Súmula 711 STF - A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.
Autor: Marcel Figueiredo Gonçalves.
Comentários: quando da prática de uma conduta criminosa, o agente responde pelo crime com a lei que está em vigor no momento de sua ação. Não importa o dia do resultado, e sim o momento da conduta (ativa ou omissiva). Aplica-se a lei que está em vigor quando da prática da ação ou da ocorrência da omissão. V. art. 4º CP: Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado.
Então, se João matou Maria em 12/07/2021, estará sujeito às penas do art. 121 que estão em vigor nesta data: 6 a 20 anos de reclusão. Se, no dia 15/07/2021 advier uma lei penal nova que aumente a pena do homicídio, por exemplo, para 10 a 25 anos de reclusão, João responderá ainda com a pena de 6 a 20 anos. E isso mesmo que Maria venha a falecer, por exemplo, no dia 17/07/2021, em vista da regra que vimos acima: o homicídio foi praticado em 12/07 (dia da conduta) e não em 17/07 (dia do falecimento da vítima).
Entretanto, caso esta nova lei traga uma pena mais leve, por exemplo, 4 a 10 anos de reclusão, João responderia por esta nova lei. Tudo isso em nome da irretroatividade da lei penal pior e retroatividade da lei penal melhor: a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.
Em caso de crime permanente ou continuado, este raciocínio continua válido, contudo, estes crimes possuem suas peculiaridades.
O crime permanente é aquele cuja consumação não se dá em um momento instantâneo, imediato, isto é, sua consumação se dá enquanto perdurar uma determinada situação, prolonga-se no tempo. Exemplo clássico é a extorsão mediante sequestro: enquanto a vítima estiver em cativeiro, o crime está ocorrendo, se consumando. Assim, se neste intervalo de tempo, advier uma lei penal nova que prejudique o autor da extorsão, ele responderá com esta nova lei penal mais grave, pois, neste caso, o crime ainda estava ocorrendo. Não se trata, portanto, de lei posterior pior, mas sim de lei vigente ao tempo da prática do crime.
Já no crime continuado, adota-se, por doutrina jurídica, a ideia fictícia de unidade delitiva. Diversas condutas criminosas são praticadas para se chegar a um resultado, logo, a quinta ou sétima conduta, por exemplo, fazem parte da primeira ou segunda condutas já praticadas em momento anterior. Assim, se, neste ínterim, advier nova lei pior, é ela que será aplicada, pois trata-se aí de uma unidade delitiva praticada pelo autor do crime. Ou seja, o conjunto de atos é considerado como conduta única e, quando da prática desta, surgiu uma lei penal mais gravosa. Vamos usar de um exemplo clássico: Maria é empregada doméstica na casa de Flores. Maria quer furtar toda a coleção de talheres de prata de sua empregadora. Para não ser descoberta, Maria leva para casa, dia após dia, um talher da coleção. Suponha que Maria tenha praticado seu primeiro ato em 1/4/2022. A partir deste dia, furtava um talher por dia, visando toda a coleção. No dia 15/4/2022 surge uma lei penal que agrava a pena do crime de furto. Maria acaba sua empreitada em 30/4/2022. Por ficção jurídica, de 1/4 a 30/4, por mais que tenham ocorrido 30 condutas de furto, considera-se que, por terem sido praticadas em continuidade delitiva, houve conduta única. Maria irá responder com a lei de 15/4/2022, pois, quando da prática do crime único de "furtar toda a coleção" já estava em vigor a lei que aumentou a pena do furto. Não importa se, antes do dia 15, havia pena menor prevista.
Por isso se
dizer que, para crimes continuados ou permanentes, advindo uma nova lei penal
pior, é ela que será aplicada, pois (a) o crime ainda está ocorrendo, no caso
dos crimes permanentes ou (b) trata-se de conduta criminosa única, no caso do
crime continuado. Em um ou outro caso, está-se aplicando a lei penal vigente
ao tempo do crime.