Súmula 536 STJ - A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha.
Autor: Marcel Figueiredo Gonçalves.
Comentários: vamos ver, bem por alto, algumas considerações sobre a suspensão condicional do processo e a transação penal, apenas para nos contextualizar.
A suspensão condicional do processo (sursis processual) é prevista na lei 9.099/95, que assim diz: Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).
Então, quando cabe o sursis processual? Quando a pena mínima cominada à infração for igual ou inferior a 01 ano, sendo ela uma contravenção penal, um crime de menor potencial ou qualquer outro: se tiver pena mínima igual ou inferior a 01 ano, deve-se oferecer o sursis. Verificado isso, será estabelecido um prazo (entre 2 a 4 anos) em que o processo será suspenso. Dentro deste prazo, o réu terá que cumprir algumas condições. Cumpridas as condições, o processo, que estava suspenso, será agora extinto, ficando o réu livre daquela acusação. Não cumprida uma condição, volta a andar o processo. Ou seja, é um benefício para o réu, pois, se cumprir as condições, não terá passado pelo processo nem terá sido efetivamente condenado a uma sanção criminal. Tudo em nome da intervenção mínima do Direito Penal, entre outras razões de política criminal.
E a transação penal? É outra forma de se evitar a continuidade do processo. É uma oferta do Ministério Público (MP) ao acusado, para que este receba de imediato uma pena de multa ou restritiva de direito. Ao invés de se continuar o processo e o réu correr o risco de receber uma pena mais grave (isso ocorre geralmente quando as provas são irrefutáveis), poderá ele aceitar de imediato o cumprimento de uma multa ou restrição de direitos, encerrando-se o processo. V. art. 76 da lei 9.099/95: Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta.
É o membro do MP que deve oferecer a transação penal. Mas, se a ação for privada, tem-se admitido que a parte, por meio de seu advogado, tente a transação também.
Para poder haver a transação, há requisitos a serem cumpridos pelo acusado:
- Não já ter sido condenado definitivamente por crime com uma pena privativa de liberdade; se já o foi por contravenção, cabe a transação.
- Não ter recebido uma transação penal nos últimos 05 anos, ou seja, já recebeu uma pena restritiva ou de multa como forma de transação penal nos últimos 5 anos, não poderá receber outra agora;
- Personalidade, conduta social e antecedentes indicarem ser adequado.
Em suma, estes são os dois institutos da lei 9.099/95 que estão previstos na súmula em estudo.
Segundo esta súmula, estes dois institutos não são aplicáveis quando o caso envolver violência doméstica ou familiar contra a mulher. Isto é, não vai haver estes benefícios para o réu, pois a intenção da Lei Maria da Penha (lei 11.340/06) é proteger ao máximo a vítima mulher deste tipo de violência, tentando-se inibir sua prática com previsões legais mais rigorosas. É obediência ao art. 226, §8º CR: § 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. Não há que se falar, portanto, em desigualdade de tratamento, mas, sim, em políticas de busca de uma menor desigualdade.
Mas, não é só. Algumas observações devem ser feitas sobre esta súmula:
- A súmula diz que estes institutos não se aplicam no caso do cometimento de delitos, sinônimo de crimes. Mas, tanto para crimes como para contravenções penais, se cometidos em contexto de violência doméstica ou familiar contra a mulher, estes institutos serão inaplicáveis. A interpretação deve ser mais ampla, pois a Lei Maria da Penha visa trazer a maior proteção possível às vítimas mulheres (interpretação histórica e teleológica).
- As infrações penais, se cometidas em contexto de violência doméstica ou familiar contra a mulher, não estarão sujeitas a quaisquer institutos previstos na lei 9.099/95, e não só aos institutos da suspensão do processo e transação penal. É o que diz o art. 41 da Lei Maria da Penha: Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.Ou seja, muito embora a súmula se refira apenas à suspensão condicional do processo e transação penal, absolutamente nada da lei 9.099/95 poderá ser aplicado quando o caso for de violência contra a mulher no contexto doméstico.
Em resumo: seja crime ou contravenção, praticado com violência
doméstica à mulher, a ele não será aplicado nenhum instituto da lei 9.099/95.
Talvez esta seria a melhor redação para a súmula.